Nestes 25 anos de vigência da Constituição da República, conhecida como Constituição cidadã, houve uma explosão de demanda. Vários instrumentos foram disponibilizados ao cidadão, visando à democratização da justiça, tornando-a acessível a todos. Podem ser citados, como exemplos, a ampliação dos quadros da Defensoria Pública, assegurando assistência judiciária gratuita para os necessitados, a criação dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais, o próprio sistema de proteção do Código de Defesa do Consumidor, entre outros. É fato que a estrutura do Poder Judiciário não acompanhou esse progressivo crescimento da demanda, e as últimas estatísticas do CNJ apontam para a existência de mais de 100 milhões de processos em curso, nas várias cortes de justiça deste país. Para cada dois habitantes, um processo! Isso é incrível!
A mídia, por sua vez, noticia o alto custo do sistema judiciário para o cidadão brasileiro. Algo em torno de R$ 80 bilhões por ano. Além do alto custo, a resposta geralmente se manifesta ineficiente.
Consciente de que justiça tardia, muitas vezes, é pior do que injustiça, a sociedade está em busca de soluções para resolver esse quadro que se reconhece dramático. E já se deu conta de que a justiça estatal, por maiores que sejam os esforços para melhoria de seus quadros funcionais, para a construção de novas instalações, jamais dará conta desse exponencial crescimento da demanda por justiça. Por isso, buscam-se alternativas na chamada justiça privada, cujos bons exemplos são a conciliação, a mediação, a negociação e a arbitragem.
A conciliação já vem sendo amplamente desenvolvida em vários setores, públicos e privados, assim também a negociação, ambas, porém, ancoradas na lógica do ganha-perde, da barganha. Nem por isso, entretanto, se duvida do grande valor desses instrumentos nesse processo de descongestionamento do Poder Judiciário. A arbitragem, por sua vez, ainda é um procedimento caro, específico para os litígios que envolvem uma expressão econômica de maior dimensão. Em bom tempo, portanto, o legislador vem incorporar a mediação em nosso ordenamento jurídico, instrumento largamente utilizado na Europa e nos Estados Unidos.
A mediação, sem sombra de dúvida, é a melhor alternativa para solução de controvérsias. Em primeiro lugar, o instituto está alicerçado no princípio da autonomia da vontade. Ninguém pode ser forçado a mediar. A pessoa deve querer a mediação. Esclarecido o procedimento, seus objetivos e o papel dos mediadores, a pessoa tem liberdade para aceitar a mediação.  Em segundo lugar, na mediação, as pessoas são colocadas em igualdade de condições. O mediador utiliza-se das técnicas específicas, para assegurar esse tratamento isonômico, em pé de igualdade, às partes. Em terceiro lugar, tem-se como inegável benefício a confidencialidade, porque nada do que é discutido na mediação há de alcançar publicidade, sem o consentimento das pessoas envolvidas. É um procedimento informal, célere, participativo e de baixo custo. Além do mais, o principal benefício é que, na mediação, não se busca apenas acabar com o litígio, mas sim com a causa, com a origem do mesmo.
Na mediação, as partes são chamadas a dialogar. Busca-se restabelecer a cultura do diálogo, a desenvolver uma prática esquecida nesse barulhento mundo moderno, que é a escuta.  Procura-se identificar os interesses, as necessidades das pessoas envolvidas, afastando a pessoa do problema.
Relevante notar que o mediador nada decide. Ele não julga, não emite opiniões, ele apenas auxilia as partes a compreender os pontos de vista, as necessidades de um e do outro, colabora na identificação de opções possíveis, a definir a melhor solução para o caso litigioso, ajudando a construir um esquema de relacionamento que seja mutuamente satisfatório. A expectativa é a de que, tendo as partes, elas mesmas, construído o acordo, que não é imposto pelo juiz, ou por qualquer terceiro, tenham mais compromisso em seu cumprimento.
No âmbito do Poder Judiciário, mesmo antes da entrada em vigor da Lei de Mediação – lei 13.140, de 26/6/2015 – e do novo CPC, o CNJ já havia editado a Resolução 125, traçando o procedimento da mediação no âmbito dos Tribunais do país, e tratando da mediação comunitária, como eficaz instrumento de pacificação.
Existe a crença de que a mediação será sempre melhor praticada fora do Judiciário. Por isso, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro vem celebrando convênios com várias entidades, visando capacitar mediadores para atuar na esfera extrajudicial. Nesse programa, está incluído o projeto de mediação comunitária.
Nesse Ano da Misericórdia, quando o Papa Francisco a todos convida a assumir o papel de mediadores da misericórdia, a Arquidiocese do Rio de Janeiro tomou a iniciativa de celebrar com o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro o convênio para capacitação de mediadores comunitários, para atuarem nos centros de mediação a serem instalados nos vicariatos.
Os mediadores comunitários estão aptos para atuar em conflitos que versam sobre direitos disponíveis, ou sobre os indisponíveis que admitem transação. Assim, nos conflitos entre vizinhos, nos decorrentes de contratos celebrados pelas partes, locação, compra e venda, até mesmo em alguns conflitos de direito de família.
A pessoa envolvida em uma situação litigiosa deve procurar o centro de mediação comunitária, onde receberá informações sobre a mediação, se for caso de seu emprego. Sendo seu desejo dar início ao procedimento, deverá fornecer o nome e endereço completo da outra parte envolvida, que será convidada a participar da mediação em data previamente designada e conduzida por equipe de mediadores capacitados. Comparecendo as partes e anuindo ambas, terá lugar a mediação, que pode ser concluída em uma única sessão, como também pode se estender a outras tantas sessões quanto sejam necessárias até que seja restabelecido o entendimento entre as pessoas.
Esse é um momento de se apostar na mediação. De firmemente acreditar ser uma das vias adequada para solução dos tantos conflitos, permitindo que as pessoas que, ao longo desses últimos anos, vêm perdendo autonomia para resolver seus problemas, reassumam o controle de suas vidas e sejam capazes de tomar decisões e resolver seus conflitos, encarando-os de forma positiva, sem ter que levá-los para um juiz decidir.
Por Luisa Bottrel, Desembargadora
Fonte: Arqrio – 14/11/2016 17:50
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